PADRE ANTÓNIO VIEIRA E A SUA ÉPOCA



Padre António Vieira nasceu em Lisboa, a 6 de Fevereiro de 1608, e faleceu no dia 18 de Julho de 1697, no Colégio da Companhia de Jesus, na Baía.
Com apenas seis anos de idade, foi para o Brasil (Baía) com a sua família, dado o seu pai aí exercer o cargo de secretário da Governação. Aqui, estudou no Colégio jesuíta da Companhia de Jesus, tendo revelado desde logo a sua vocação de pregador, iniciando, por isso, a sua missão de sacerdote relativamente cedo (1635).
Mais tarde (1641) tornou-se íntimo de D. João IV, numa altura em que veio a Lisboa, acompanhado do filho do governador. Ao monarca agradou-lhe desde logo o carácter de António Vieira, que o nomeou pregador da corte, seu conselheiro e confessor.
A vida deste homem consistiu essencialmente na sua acção política e diplomática sempre no sentido de colmatar as crescentes dificuldades sociais e as desigualdades humanas existentes. Padre António Vieira pretendia, acima de tudo, estabelecer a igualdade de direitos entre católicos, protestantes, judeus e todos quantos eram segregados; formar uma sociedade justa, em que todos tivessem as mesmas oportunidades.
Neste sentido, aconselhou junto do Rei uma política alicerçada no poder económico dos cristãos-novos, facultando-lhes a possibilidade de se movimentarem mais livremente. Contudo, esta sua atitude recebeu forte oposição do Santo Ofício, força vincada contra a burguesia mercantil.
António Vieira realizou, durante toda a sua vida, grandes campanhas contra a acção brutal da Inquisição portuguesa, assim como foi também contra a escravização e exploração dos nativos do Brasil pelos colonos. Os Jesuítas defendiam precisamente a liberdade dos indígenas e empreenderam esforços neste sentido.
A acção de António Vieira como missionário, defensor das minorias, suscitou várias inimizades, nomeadamente dos colonos e outras ordens religiosas do Maranhão que os apoiavam, e que teve o seu apogeu com a sua condenação por opiniões heréticas pelo Tribunal do Santo Ofício (1665/67).
A morte de D. João IV agravou a situação deste homem que perdeu um apoio importantíssimo para as obras que pretendia realizar. Entre outros feitos, D. João IV incrementou a cultura portuguesa, nomeadamente através da criação da Academia Real de História, aspirando dignificar o património literário nacional, se bem que orientado segundo um critério valorizador do absolutismo.


Depois da sua amnistia, Padre António Vieira partiu para Roma, onde exerceu bastante pressão contra a Inquisição portuguesa junto da Santa Sé. A verdade é que a sua acção exemplar como pregador o ajudou neste seu intento que, embora não bastasse para demolir por completo o Santo Oficio, abalou bastante a credibilidade desta instituição.
Mais tarde, regressou definitivamente à Baía, onde exerceu, até à sua morte, as funções de superior das missões em todo o Brasil e Maranhão.
Nos derradeiros anos da sua vida, dedicou-se ainda à edição das Cartas e dos Sermões, obra que é composta por quinze volumes e nos dá uma visão real e cabal, imbuída de um espírito humanitário e de bom senso, acerca da vida dos indígenas, que desde muito cedo preocupou a mente de um dos nomes mais ilustres do Barroco em Portugal.
Enquanto a estrutura das Cartas se confina a um discurso simples e familiar, a dos Sermões firma-se num exórdio ou introdução, em que o orador expõe o assunto que vai tratar sob a forma de um conceito predicável; numa exposição e confirmação, em que faz o desenvolvimento do pensamento apresentado, usando argumentos e exemplos que validem a sua ideia; e, por fim, numa peroração ou conclusão, em que o pregador faz uma conclusão de modo a deixar clara a sua opinião sobre o exposto, sempre com o intuito de convencer o(s) ouvinte(s) da sua verdade.


Vieira e o Quinto Império


A mais famosa criação da sua imaginação é a teoria do quinto império do mundo, sob a égide do rei de Portugal, quinto império que seria inaugurado com a segunda vinda de Cristo à Terra e com a chegada do messias dos judeus: «O qual seria D. João IV, a quem estava perfeitamente destinado derrotar definitivamente os Turcos e reconduzir os judeus dispersos no mundo à sua terra de origem, a Palestina.» O ponto de partida desta construção eram as trovas do Bandarra, um sapateiro de Trancoso, contemporâneo de Gil Vicente. Mas já a Crónica do Imperador Clarimundo apontava para uma monarquia universal portuguesa. O quinto império tem a ver com a missão providencial dos Portugueses (equivalente à dos Hebreus no seu tempo):

Nascer pequeno e morrer grande é chegar a ser homem. Por isso nos deu Deus tão pouca terra para o nascimento e tantas para a sepultura. Para nascer pouca terra, para morrer toda a terra. Para nascer Portugal, para morrer o mundo.

A doutrina do quinto império, tal como é tratada por Vieira, especialmente na sua obra incompleta História do Futuro, tem um lado prático: obter o regresso a Portugal dos judeus fugidos e seus capitais. As circunstâncias da cultura portuguesa, assim como a situação dos índios no Brasil, foram por ele descritas com saliência e realidade em várias cartas e relatórios.
A imaginação verbal, e o estilo de pensar, com os seus paradoxos, aproximam o Pe. Vieira de Fernando Pessoa; este chamou ao seu mestre «imperador da língua portuguesa».

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