Cenário, atmosfera e simbologia em Frei Luís de Sousa

Cenário

O Acto I passa-se numa "câmara antiga, ornada com todo o luxo e caprichosa elegância dos princípios do século XVII", no palácio de Manuel de Sousa Coutinho, em Almada. Neste espaço elegante parece brilhar uma felicidade, que será, apenas, aparente.

O Acto II acontece "no palácio que fora de D. João de Portugal, em Almada; salão antigo, de gosto melancólico e pesado, com grandes retratos de família...". As evocações do passado e a melancolia prenunciam a desgraça fatal.

O Acto III passa-se na capela, que se situa na "parte baixa do palácio de D. João de Portugal". "É um casarão vasto sem ornato algum." O espaço denuncia o fim das preocupações materiais. Os bens do mundo são abandonados.
A atmosfera
Há ao longo da intriga dramática uma atmosfera psicológica do sebastianismo com a crença no regresso do monarca desaparecido e a crença no regresso da liberdade. Telmo Pais é quem melhor alimenta estas crenças, mas Maria mostra-se a sua melhor seguidora.
Percebe-se também uma atmosfera de superstição, nomeadamente desenvolvida em redor de D. Madalena.
Tal como na tragédia clássica, também o fatalismo é uma presença constante. O destino acompanha todos os momentos da vida das personagens, apresentando-se como uma força que as arrasta de forma cega para a desgraça. É ele que não deixa que a felicidade daquela família possa durar muito.

Simbologia
Vários elementos estão carregados de simbologia, muitas vezes a pressagiar o desenrolar da acção e a desgraça das personagens. Apenas como referência, podemos encontrar algumas situações e dados simbólicos:
- A leitura dos versos de Camões referem-se ao trágico fim dos amores de D. Inês de Castro que, como D. Madalena, também vivia uma felicidade aparente quando a desgraça se abateu.
- O tempo dos principais momentos da acção sugerem o dia aziago: sexta-feira, fim da tarde e noite (Acto I), sexta-feira, tarde (Acto II), sexta-feira, alta noite (Acto III); e à sexta-feira D. Madalena casou-se pela primeira vez; à sexta-feira viu Manuel pela primeira vez; à sexta-feira dá-se o regresso de D. João de Portugal; à sexta-feira morreu D. Sebastião, vinte e um anos antes.
- A numerologia parece ter sido escolhida intencionalmente. Madalena casou 7 anos depois de D. João haver desaparecido na batalha de Alcácer Quibir; há 14 anos que vive com Manuel de Sousa Coutinho; a desgraça, com o aparecimento do Romeiro, sucede 21 anos depois da batalha (21= 3 x 7). O número 7 é um número primo que se liga ao ciclo lunar (cada fase da Lua dura cerca de sete dias) e ao ciclo vital (as células humanas renovam-se de sete em sete anos), representa o descanso no fim da criação e pode-se encontrar em muitas representações da vida, do universo, do homem ou da religião; o número 7 indica o fim de um ciclo periódico. O número 3 é o número da criação e representa o círculo perfeito. Exprime o percurso da vida: nascimento, crescimento e morte. O número 21 corresponde a 3 x 7, ou seja, ao nascimento de uma nova realidade (7 anos foi o ciclo da busca de notícias sobre D. João de Portugal e o descanso após tanta procura); 14 anos foi o tempo de vida com Manuel de Sousa (2 x 7, o crescimento de uma dupla felicidade: como esposa de Manuel e como mãe de Maria; 14 é gerado por 1 + 4 = = 5, apresentando-se como símbolo da relação sexual, do acto de amor); 21 anos completa a tríade de 7 apresentando-se como a morte, como o encerrar do círculo dos 3 ciclos periódicos. O número 7 aparece, por vezes, a significar destino, fatalidade (imagem do completar obrigatório do ciclo da vida), enquanto o 3 indica perfeição; o 21 significa, então, a fatalidade perfeita.

- Maria vive apenas 13 anos. Na crença popular o 13 indica azar. Embora como número ímpar deva apresentar uma conotação positiva, em numerologia é gerado pelo 1 + 3 = 4, um número par, de influências negativas, que representa limites naturais. Maria vê limitados os seus momentos de vida.

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